domingo, 8 de julho de 2012

INTRODUÇÃO I

Salvador Dalí foi um dos maiores artistas plásticos de todos os tempos. Catalão, excêntrico, apaixonado, mouro, diferentemente diferente, inspirado e surrealista. Estupendo em opinar sobre o mundo através de suas imagens bizarras e oníricas, ele hoje é recordação medular quando falamos de surrealismo. Afinado com as ideias de Freud, relativamente novas e surreais para aquela primeira metade do século XX, foi também amigo do revolucionário psicanalista. Além disso, dividiu doses e devaneios com Pablo Picasso, na época que viveu em Paris. 


Não assustou-se, nem temeu as críticas artísticas e principalmente políticas que recebeu. E o mais importante, não mudou. Ou continuou mudando? Certa vez ao ser perguntado qual era a diferença dele e dos demais surrealistas, Dalí respondeu, "A diferença é que eu sou surrealista".


Fico imaginando o que o mestre espanhol teria dito, pintado, esculpido e dito ao deparar-se com o surrealismo no Brasil. "Surrealismo no Brasil?". Sinceramente, não sou especialista em artes plásticas. Mas tento entender o que acontece no Brasil, esse lugar excêntrico, mouro, diferente, inspirado e surrealista pelo qual sou totalmente apaixonado. Mas voltemos. O que teria feito Salvador Dalí ao ouvir um empresário ou deputado brasileiro, entupido de corrupção, esquemas, compadrios, compadres, capatazes, divisas (devidamente evadidas e lavadas), todas essas expostas, gravadas, confirmadas pela polícia e pela mídia, dizer em uma CPMI: "Reservo-me o direito de não responder a essa pergunta segundo a orientação do meu advogado e garantido pela constituição federal." 
Ou saber que um cidadão que trabalhou por longos 35 anos para seu país precisa entrar em uma delegacia para solicitar um atestado de que está vivo para poder receber sua aposentadoria do INSS. 
Ou ver Paulo Maluf livre. Só isso. Paulo Maluf podendo ir aonde bem entender depois de tudo que fez.
Existem fatos, fotos, quadros, esculturas ou pessoas mais surreais do que alguns/vários momentos do cotidiano brasileiro? Qual seria o resultado de um impasse ou da simples constatação de Salvador Dalí, o mestre do surrealismo, com os surrealismos dos cartórios brasileiros? Será que as pernas finas dos seus amados elefantes sustentariam tudo isso? Será que não surgiria um novo movimento artístico? Algo talvez dentro do próprio surrealismo? Talvez o ultra-surrealismo...?Uma Al Qaeda dos surrelistas.


Salvador Dalí inclinou-se muitas vezes ao simbolismo e algumas imagens são recorrentes em suas obras. Como os já citados elefantes. Eles apareceram a primeira vez em 1944, em sua obra SONHO CAUSADO PELO VOO DE UMA ABELHA AO REDOR DE UMA ROMÃ UM SEGUNDO ANTES DE ACORDAR. Ele dizia que o elefante era uma distorção do espaço, em última análise. E que suas pernas contrastavam com a ideia de imponderabilidade com a estrutura.
O ovo é outro símbolo que aparece com certa recorrência. Dalí dizia que ele representava o ideal pré natal e intrauterino. O GRANDE MASTURBADOR e METAMORFOSE DE NARCISO são grandes exemplos dessas "repetições".


Impossível não associarmos ao nosso surrealismo. O surrealismo brasileiro usa, por exemplo, o Sistema. Impressionante como ele participa da nossa obra de maneira onipresente, onipotente e inquestionável. É um símbolo recorrente do impossível e da vontade de Deus ao mesmo tempo. "Senhor, não vou poder estar registrando e encaminhando a reclamação pois o Sistema está fora!" Como reivindicar direitos e clamar por razão se o Sistema está fora? O valete fora de questão. A vida tem que aguardar. E ele participa de todas instâncias. Como já disse é onipresente. Desde uma segunda via de conta de luz (seu burro, como foi perder a primeira via?) até um mandado de busca e apreensão. Não há o que dizer. É o supremo, a Matrix, o maior Mandarim do surrealismo brasileiro.


Dentro do fascínio por Salvador Dalí e do amor pelo Brasil, vou tentar desenlaçar e misturar ainda mais esses dois gigantes. Maravilhar-se por uma obra do catalão é tão nauseante e torporoso como não entender o próprio país. A associação livre de ideias que Freud e Dalí tanto exerciam pode nos dar pistas de quem somos nós. Isso não precisa ser feito, necessariamente, através de debates intelectuais, mas sim através de coisas simples, como um ovo. Ou como a recuperação da nossa capacidade de não acreditar e de não aceitar coisas que já estão incorporadas ao nosso surrealismo, temporariamente...


Eric Grieger Banholzer 08/07/2012












Nenhum comentário:

Postar um comentário